Amauri sabia que se reencontrar com a família depois de vinte anos não seria o melhor dos momentos, ainda mais depois de tantas brigas e desentendimentos. Mas veio, primeiro pelo convite quase desesperado do pai, Hector, que já estava velho e insistia em dizer nas ligações que esta poderia ser a última oportunidade de reunir a família. E segundo, por causa da insistência de Joana, sua irmã, que afirmava planejar algo grande para aquele dia.

— Esse dia vai ser inesquecível, coisa de capa de jornal mesmo! — Joana disse quando chegaram ao casarão da família, no meio do nada. A irmã de Amauri continuava com o olhar desequilibrado de sempre, aquele que adquiriu depois de a família ruir com a morte da mãe.

O casarão era quase o mesmo de antes, com seus três altos andares. O jardim era completamente preenchido por hortênsias, as flores favoritas de Clara, a mãe de Amauri e Joana. Mesmo que algumas pessoas dissessem que aquelas plantas davam azar, Amauri era fascinado por elas, assim como a mãe. A sala era espaçosa, com vários sofás, mesas de canto, e uma excêntrica escultura de elefante, a única coisa que dava um pouco de cor ao ambiente escuro.

Milena, filha de Amauri, que nunca conheceu o restante da família além do pai e da tia, teve um dia péssimo, sentindo a tensão constante ao seu redor. Parecia que uma faísca poderia causar uma explosão entre aquelas pessoas.

Ela gostou do avô, que parecia a pessoa mais normal daquele lugar, um típico senhor rico, meio rabugento mas amoroso. Durante o dia, ajudou-o depois que ele derrubou uma taça devido a um tique nervoso que tem na mão direita. De Margarete, sua tia avó, ela não gostou tanto, é expansiva, fala alto, anda para lá e pra cá com um óculos de sol enorme, faz comentários inconvenientes o tempo todo, e transmite uma tensão que Milena não consegue identificar. A mulher cuida também dos negócios da família desde que Clara morreu, ela ficou sabendo.

O tio, Eduardo, é o pior para ela. Foi o único que permaneceu na vida do avô dela depois de todas as brigas do passado, ajudando Margarete a cuidar dos negócios, pelos quais ele se interessa mais do que qualquer outra coisa, além do dinheiro. Sua esposa, Marisa, parece uma sombra, sempre atrás dele e incapaz de agir sozinha.

Já Adelaide, governanta da casa há mais de trinta anos, parece a pessoa menos satisfeita em receber os membros da família de volta, como se a presença de todos atrapalhasse o andar de sua vida.

Ao anoitecer, Milena ouve vozes vindas da cozinha. São Adelaide e Eduardo, discutindo em voz alta. Curiosa, ela se pergunta qual seria o motivo daquela briga.